27.9.07

Do Livre Arbítrio

É propício e oportuno acreditar
que esse céu, cuja luz nos ilumina,
irritado, com um raio nos fulmina:
Oh, tão desditosa condição de errar.

E aquele que se atira, sem hesitar,
para o abismo da tentação que o fascina,
ao cair grita ter sido mão divina
que desceu dos céus para o empurrar.

Se fosse um bonifrate a nossa mente,
que a ordem superior se ergue ou curva,
de que valia a Razão refulgente?

O destino não o escreve a exacta luva
de um deus escravo ou prepotente.
O destino somos nós... a andar à chuva.

17.9.07

Tarde

É tempo de dormir.
O sol deixou-me com a paz.
A hora aponta para a cruz.
Há uma flor que se desfaz.
Outra luz está para vir.

Esqueci o dito e feito,
as pedras negras do chão,
a rua feia e escura.
No silêncio da solidão
existe outra cura no meu peito.

A vida é vela, e o pavio
vai-se apagando lentamente.
As janelas já estão fechadas
e a noite, silente,
desce as arcadas do meu frio.

10.9.07

Semáforo

Verde!
Mata-se a sede de tempo
com o passo apressado.
Os ombros são máquinas de guerra
que guardam os flancos,
e os dentes brancos
hostilizam quem atravessa
sem pressa.

Vermelho!
O outro lado do espelho
ameaça o ataque
ao som do batuque.
O mínimo erro pode ser fatal.
Os olhos devoram o sinal.

Verde!
A infantaria avança destemida
de ambos os lados.
Choram crianças,
chocam soldados,
tinge-se a rua
com o sangue da luta.
Os fracos são deixados para trás
entre gritos de viúvas
e membros cortados.

Vermelho!
Silêncio.
Silêncio.
Preparam-se os novos soldados.
Efémera é a paz na cidade.